O texto teatral - Uma linguagem encenada

Por Vânia Maria do Nascimento Duarte


A dramaturgia – característica norteadora da modalidade

A história do teatro remonta desde a Grécia antiga (séc. V a. C.), na qual a representação teatral era concebida como a principal atividade artística. Encenavam-se peças, em especial as tragédias, cujo intuito era conduzir os expectadores à catarse - uma espécie de purificação da alma, dada pela liberação das emoções.

Com o passar do tempo, novas modalidades foram se incorporando ao gênero dramático, tais como: as comédias, representações nas quais a temática perfaz-se de fatos circunstancias e corriqueiros, tendo pessoas pertencentes às classes populares como personagens; o auto, uma peça curta e de cunho religioso, cuja temática liga-se a entidades abstratas (amor, hipocrisia, bondade, virtude, dentre outras); e a farsa, voltada para a sátira dos costumes sociais. Desta feita, a concepção catártica foi se esvaindo, cedendo lugar para novos postulados – denúncia de injustiças sociais, reflexões filosóficas acerca de fatos cotidianos, entre outros.

Ao estabelecermos familiaridade com o texto dramatizado, percebemos que ele se assemelha ao narrativo no tocante a vários aspectos, tais como, personagens, enredo, tempo e espaço. Entretanto, diferenças também se acentuam, visto que no texto teatral, a interação entre os interlocutores é estabelecida por meio da própria representação, ora manifestada pelo discurso direto. Tal fato condiciona-se à ausência do próprio narrador, pois é mediante a desenvoltura dos próprios personagens que o enredo é paulatinamente retratado.

Outro aspecto bastante peculiar reside na atribuição dada ao conflito, elemento primordial no gênero em questão. Em meio ao desenrolar do diálogo cria-se uma situação conflituosa caracterizada por uma oposição e uma luta de vontades entre os personagens, condicionando a plateia/leitor a criar uma expectativa em relação aos fatos presenciados ou lidos.

Para que possamos constatar acerca de como tais pressupostos se materializam, analisaremos, pois, alguns fragmentos inerentes à peça intitulada O Auto da Compadecida, de Ariano Suassuna:

[...]

JOÃO GRILO
Ele diz “à misericórdia”, porque sabe que, se fôssemos julgados pela justiça, toda a nação seria condenada.

PALHAÇO
Auto da Compadecida! (Cantando.) Tombei, tombei, mandei tombar!
ATORES, respondendo ao canto
Perna fina no meio do mar.

PALHAÇO
0i, eu vou ali e volto já.
ATORES, saindo
Oi, cabeça de bode não tem que chupar.

PALHAÇO
O distinto público imagine à sua direita uma igreja, da qual o centro do palco será o pátio. A saída para a rua é à sua esquerda. (Essa fala dará ideia da cena, se adotar uma encenação mais simplificada e pode ser conservada mesmo que se monte um cenário mais rico.) O resto é com os atores.

Aqui pode-se tocar uma música alegre e o Palhaço sai dançando. Uma pequena pausa e entram Chicó e João Grilo.

JOÃO GRILO
E ele vem? Eu estou desconfiado, Chicó. Você é tão sem confiança!

CHICÓ
Eu, sem confiança? Que é isso, João, está me desconhecendo? Juro como ele vem. Quer benzer o cachorro da mulher para ver se o bicho não morre. A dificuldade não é ele vir, é o padre benzer. O bispo está aí e tenho certeza de que o Padre João não vai querer benzer o cachorro.

JOÃO GRILO
Não vai benzer? Por quê? Que é que um cachorro tem de mais?

CHICÓ
Bom, eu digo assim porque sei como esse povo é cheio de coisas, mas não é nada de mais.
[...]


Situamo-nos diante de uma considerável peça que constitui o cenário das artes cênicas, na qual o autor propõe-se a retratar temas universais, tais como a avareza e suas inevitáveis consequências – atitude esta, abominável diante dos preceitos ligados ao Cristianismo. Sendo assim, a obra revela essa estreita intimidade estabelecida entre as relações humanas e o divino.

Familiarizados com o enredo, podemos identificar outras características que o demarcam, como é o caso da fala direta dos personagens, bem como a presença de parênteses seguidos de seus respectivos enunciados linguísticos. Ressalta-se para o fato de que estes recebem uma denominação específica, caracterizados por rubricas, as quais descrevem os elementos que compõem a ação, como, atitude dos personagens, movimentação entre estes, postura corporal e demais procedimentos.

Não podemos, aqui, deixar de mencionar acerca dos outros elementos que, juntamente com os personagens, colaboram para a concretude da arte em questão. Entre eles citamos: a música, arquitetura, pintura, a arte indumentária (o figurino), iluminação, o mobiliário usado na representação, maquiagem, sonoplastia e contrarregra.

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